quinta-feira, 26 de junho de 2008

Vico



por Augusto Patrini Menna Barreto Gomes



Giambattista Vico (1668-1774): Entre os historiados Vico é considerado um dos pioneiros da reflexão moderna sobre o tempo histórico ou das Teorias da História. A forma como ele pensou o tempo, no livro “A ciência Nova” é considerada original e pioneira. A sua concepção de história ideal eterna é, em seu tempo, uma forma nova de concepção temporal e histórica. Sua trajetória biográfica é das mais especiais, porém não me cabe aqui comentá-la, já que penso que muitas outras pessoas participantes desta “jornada” o farão. Entretanto, seria importante lembrar alguns pontos para aqueles que conhecem pouco de suas reflexões sobre o tempo histórico, para então passar para alguns comentários sobre seus intérpretes contemporâneos. O pensamento de Vico apresenta algumas ambigüidades e complexidades e é bastante peculiar, pois se desenvolveu em oposição ao racionalismo cético “cartesiano”, contudo fez parte do que hoje poderíamos chamar de “iluminismo”, pois buscava um método para se estudar história. O que se segue é fruto de uma primeira leitura, pessoal, entre tantas outras possíveis e mais abrangentes.
As teorias de Vico sobre o tempo histórico são marcadas pela possibilidade em se traçar paralelos entre a história e as mais variadas “nações” humanas. Porém esta concepção cíclica dizia respeito aos povos bárbaros, e não aos povos do judaico-cristianismo que se inseriam na tradicional história revelada
Bem, esta concepção de tempo histórica cíclica – era aberta, fundada por uma proposição em que se poderia estabelecer “classificações” entre diversas eras. De forma bastante simples períodos históricos eram, segundo ele,: a era religiosa – onde havia preponderância da religião; a era heróica – definida pelo despotismo, guerras e violência; e a era dos homens – aquela da utilização da razão e da preponderância dos homens. Esta última seria para ele, entretanto também o começo da decadência de um ciclo, marcando assim que sua visão cíclica do tempo histórico não era fechada, mas aberta. Se fizéssemos um paralelo geométrico, o tempo em Vico seria marcado não por um arco, mas por uma espiral. Cada uma destas eras seria marcada por tipos diferentes de línguagem.
Arrisco, aqui em fazer uma suposição que talvez sua compreensão teórica do tempo aproximava-se mais daquelas existentes no oriente ou ainda daquelas de Shelling ou de Fitche. Quem sabe, penso eu, seria mesmo possível traçar alguns paralelos ou até influências de Vico nas teorias de pensadores posteriores como Hegel, Marx, Comte e Spengler. Estes pensadores viam o tempo histórico marcado por um desenvolvimento processual, que poderia ser interpretado como cíclico, e que culminariam em uma fase final – o Estado prussiano para Hegel, a sociedade positiva para Comte, o comunismo e a ditadura do proletariado para Marx, e a decadência do ocidente para Oswald Spengler. Entretanto, estas são ainda suposições, resultado de uma primeira leitura de Vico, que deverão ainda ser aprofundadas futuramente para se pensar seriamente em qualquer paralelo ou influência.
Para Vico, entretanto, do mesmo modo que o mundo natural é concreto, o mesmo acontece com o mundo social – ou seja, a realidade do mundo social é a História. Como nos esclarece o professor Humberto Guido, para Vico, eu cito: “A ciência social permite o conhecimento do ato de criação do mundo civil, porque é a mente humana que incessantemente cria este mundo, por isso com propriedade o mundo histórico é o mundo das mentes humanas ou o mundo metafísico”.[1] Para ele, é claro não seria possível pensar a ciência sem método. Cito mais uma vez o professor Guido, para Vico: “A Filosofia orienta a arte da escavação do terreno da memória, que esconde no seu interior os registros do passado. [...] A memória para Vico é a mentalidade comum da humanidade que promove a imanência do passado no presente, preservando os valores sociais que sustentam a sociedade humana, assim como os mitos gregos sustentaram por um determinado período a sua sociedade. [...] O advento da ciência, a qual faz surgir um novo ordenamento das coisas humanas.”[2]
Entretanto, para Vico, parece ser inviável ao homem moderno, penetrar completamente no pensamento humano primitivo, pois este seria marcado por um caráter poético incompressível para as “nossas mentes civilizadas.” Ou seja, para ele, quem pretende tentar realizar este empreendimento arriscado – desvelar o pensamento do homem do passado - deve estar ciente que o fará a partir de seu próprio tempo e própria mente.

2. R. G. Collingwood (1889 - 1943): filósofo e historiador, professor de filosofia metafísica na universidade de Oxford, foi bastante influenciado por Croce, Kant e Vico. Em seu livro “A idéia de História”, ele nos apresenta Vico como um pensador e historiador anticartesiano, que tentou formular um método histórico, assim como Bacon o havia feito para o método científico. Nesta tentativa, lembra-nos Collingwood, Vico entrou em choque com o pensamento cartesiano, que para ele só poderia ser aplicado à matemática, e desta forma afirmou que o critério da verdade, não é um postulado “claro e distinto”, mas “subjetivo e psicológico”. Collingwood afirma a propósito desta formulação de Vico: “O fato de eu considerar as minhas idéias claras e distintas só prova que eu acredito nelas, não que são verdadeiras.” E ainda: “Qualquer idéia, diz Vico, ainda que falsa, pode convencermos pela sua aparente auto-evidência – e nada fácil do que considerar auto-evidentes as nossas convicções, quando, na verdade são ficções infundadas, atingidas por meio de argumentação sofística.” Assim, Collinwood lembra-nos da convergências destas idéias de Vico com aquelas de Hume, explicando-nos que Vico buscava um princípio que permitisse diferenciar aquilo que pode ser conhecido daquilo que não pode. Ou seja, Vico buscava uma doutrina que encontrasse limites para o conhecimento humano – e por isso chega à hipótese verun et factum convertuntur – ou “O que é verdadeiro e o que está feito equivalem-se”. Isso quer dizer, somente podemos conhecer aquelas coisas que tenham sido criadas. Para Collingwood este postulado, verum-factum, permite a Vico concluir que a História é uma forma de conhecimento feita exclusivamente pelo espírito humano, e, conseqüentemente, apta a ser um conhecimento em sentido pleno.
No que diz respeito à compreensão de História, Collingwood destaca que Vico encarava o tempo histórico como um processo – durante o qual os homens “elaboram variados sistemas de linguagem, costumes, leis, governo”. A história seria, pois a história da gênese e de seu desenvolvimento. Collingwod destaca a modernidade desta compreensão, pois que ações históricas do homem não encontram antinomia nas ações divinas. Igualmente como lembra-nos como o sistema histórico de Vico não era prefixado, nem fechado, sem ter em si uma pré-determinação – pois é completamente humano. Desta forma, para ele é manifesto que Vico via no Homem o centro e ator único da História – e isto é particularmente moderno e inovador.
Abrevio aqui meus comentários sobre a interpretação de Collingwood, Pois já tivemos na apresentação de Gustavo uma análise aprofundada sobre essa questão.[3]

3. Isaiah Berlin (1909-1987): filósofo e historiador das idéias, nascido em 1909, em Riga, atual Letônia, Isaiah Berlin foi um homem liberal que tentou tornar mais claras as idéias de grandes pensadores e literatos, sem no entanto reduzi-los ou simplificá-los – foi certamente um importante defensor da História das idéias. Construiu sua carreira na Inglaterra e Estados Unidos, ao longo da qual foi fortemente influenciado por Collingwood. Em sua vida intelectual, refletiu sempre a História como uma história da liberdade, onde os indivíduos tinham seu papel marcante – negando assim concepções deterministas (como, por exemplo, o marxismo ou teorias evolucionistas) e dogmáticas. Pensou por outro lado, uma história das idéias não desvinculada de sua historicidade. A possibilidade de liberdade humana era assim, para ele sempre marcada por sua historicidade.
Em seu artigo “Gianbattista Vico e a História da Cultura”[4], ele reflete sobre o fazer historiográfico, apresentando-nos as idéias de Vico. Ele começa o texto identificando formas de se compreender e fazer a história, e critica veementemente algumas formas: como, por exemplo, as visões escatológica dramáticas, a história total-positivista viciada na busca de leis e causas, assim como aquela historiografia de cunho antiquário, do historiador curioso auto-centrado, que pode servir mesmo que involuntariamente a justificar formas de nacionalismo e auto-afirmação. Sua crítica também incide sobre algumas das concepções iluministas de história, como aquelas de Voltaire, Rousseau, Condorcet – que, segundo Berlin, possuíam uma abordagem anti-histórica da natureza humana, crendo em uma verdade uma e indivisível. Em suas palavras “[...] a idéia de que todas as grandes culturas eram ramo da mesma árvore do iluminismo – de que o progresso humano era basicamente um único movimento progressista, interrompido por períodos de retrocesso e colapso, mas nunca destruído, constantemente renovado e avançado cada vez mais em direção da vitória final da razão – em geral continuou dominar o pensamento ocidental.”[5] Lembra-nos também das contestações a esse tipo de ideário, vindas de pensadores oriundos do protestantismo, mas sobretudo a partir do romantismo alemão, como especialmente aquela de Herder, para quem haveria finalmente uma variedade de rumos históricos-temporais, ligados às particularidades dos povos e de suas terras. Contudo ele não deixa de lembrar-nos dos perigos dessas concepções românticas que puderam ou podem levar a justificação de nacionalismo e chauvinismos. Ele afirmava: “[...] a história das idéias oferece poucos exemplos de uma mudança tão dramática de perspectiva como do surgimento de uma nova crença não tento na inevitabilidade, mas no valor e na importância do singular e do único, da variedade enquanto tal; e também da convicção correspondente de que existe algo de repressor e profundamente pouco atraente na uniformidade; e de que, enquanto a variedade é sintoma de vitalidade, o oposto não passa de uma sombria monotonia desprovida de vida. Na verdade, essa noção de sentimento, que hoje nos parece tão natural, não é compatível com uma percepção do mundo segundo a qual a verdade é única em todas as partes, enquanto o erro é múltiplo, ou com a percepção de que o Estado ideal é aquele em que existe total harmonia, enquanto as diferenças de perspectivas ou opinião aparentemente irreconciliáveis constituem um sintoma de imperfeição – de incoerência devida ao erro, à ignorância à fraqueza ou ao vício.”[6].
Para ele, as bases do universalismo e da veneração da unidade humana tinham sua origem no platonismo, no judaico-cristianismo, assim como no Iluminismo e no Renascimento – e assim aponta que nenhuma doutrina monística que aprende o tempo teleologicamente pode admitir a variedade. Ele destaca, entretanto, mesmo com as resalvas citadas acima, a importância dessas novas compreensões da história, desde Fichte e Herder, em que o movimento do desenvolvimento humano não era mais entendido como dotado de uma única direção, mas de uma variedade de culturas e percepções. De tal modo que ele aponta Herder como o principal defensor dessa idéia da multiplicidade histórico-temporal, e vai mais longe diz que ironicamente foi Walter Scott o homem que deu substância a essas idéias. “Os melhores romances históricos de Scott apresentam pela primeira vez indivíduos, classes e até mesmo sociedades inteiras com aparência de sólida realidade, como personagens totalmente realizados e não como personagens se movimentando em um palco, como os genéricos e bidimensionais de Tito Lívio, de Tácito ou até de Gibbons e Hume.”[7] Conseqüentemente, para Berlin, foi Herder o descobridor do que ele chama “natureza dessa espécie de percepção imaginativa”, que em termos teóricos o primeiro que percebeu-a e indicou a possibilidade de aplicação foi justamente Gianbattista Vico – para ele o verdadeiro pai da História.
Para Berlin, Vico é o pai tanto do conceito moderno de cultura quanto de pluralismo cultural: “segundo a qual toda cultura autêntica possui seu próprio e singular ponto de vista, sua própria escala de valores, que ao longo de seu desenvolvimento, é substituído por outros pontos de vista e valores, mas nunca de maneira completa: ou seja, os antigos sistemas de valores não se tornam totalmente ininteligíveis para as novas gerações.”[8] Isso, por que, fala-nos Berlin, Vico acreditava que a História era da ordem exclusivamente humana, assim permitindo que pela “imaginação”, houvesse a capacidade de penetrar ou entrar em outra concepção de mundo, sendo possível regatar o que foi “a vida das criaturas remotas do tempo e no espaço” Essa capacidade de “fantasia” apontada por Vico é inferida por Berlin como a capacidade que nós homens temos de compreender o que significa amar, odiar, lutar, trair, ser oprimido etc – ou seja, essa capacidade seria uma porta aberta para resgatar em alguma medida as realidades passadas. Berlin também destaca o caráter anti-utópico da concepção de tempo de Vico, que não pode nos servir como modelo para as historiografias celebrativas, ou aquelas que compreendem o homem como ser estático e imutável no tempo e no espaço.

4. Hayden White[9]: Hayden White, historiador e filósofo norte-americano nascido em 1928, fez uma reflexão a partir de Vico completamente diferente daquelas abordadas anteriormente. Seus pressupostos são narrativistas, centrando suas reflexões no discurso e na linguagem da historiografia. Suas teses, em grande parte baseadas no questionamento discursivo que deita raízes em Nietzsche, são fortemente polêmicas e encaradas com forte resistência no meio historiográficos acadêmicos. Isso por que suas teorias em alguma medida “borram” as fronteiras entre História e Ficção. Estas teorias centram-se na trama discursiva do texto historiográfico: que para ele podem ser, segundo o modo de argumentação, formalista, organicista, mecanicista e contextualista.[10] Do mesmo modo, estudando textos historiográficos ele identificou “modos de elaboração de enredo”: Romanescos, cômicos, trágicos e satíricos, assim como tendências ideológicas: anarquistas, conservadoras, radicais e liberais.
Ele escreve um artigo sobre Vico, utilizando-se de alguns destes conceitos: trata-se de “Os trópicos da História: a estrutura profunda de ‘Ciencia Nova’”, presente no livro “Trópicos do Discurso: Ensaios sobre a crítica da cultura”[11]. Trata-se de uma justificativa e ao mesmo tempo uma aplicação para suas teorias relacionadas ao discurso histórico. Para White escrever história é “preencher lacunas”, selecionar e escolher, consciente ou inconscientemente, prerrogativas e significados mais ou menos arbitrário. Nesse sentido, a elaboração da capacidade de fantasia destacada por Vico como capacidade fundamental para conhecer o passado, parece-lhe um tanto cara. Neste texto ele afirma: “A reivindicação de originalidade por parte de Vico não pode ser posta seriamente em dúvida, embora o grau em que ele antecipou e influenciador pensadores subseqüentes provavelmente continuará a ser um debate por algum tempo. Na sua própria época, essa originalidade consistia principalmente em sua insistência, contrariamente aos cartesianos e alguns jusnaturalistas, na necessidade de um aparato conceitual distinto para a análise de fenômenos sociais e culturais a partir do que se poderia usar legitimamente para analisar os processos e estruturas da natureza física. A fórmula em que esse princípio se expressou asseverava a “conversibilidade” do “verdadeiro” e do “fabricado”, ou o princípio do verum ipsum factum. Ou seja como já foi dito, para Vico, o homem somente poderia conhecer o que por ele foi feito – e isto implicava uma separação entre as dimensões humanas e as naturais[12].” Sua originalidade também, segundo White foi antecipar, para o bem ou para o mal, que o mundo empírico antecede o mundo das idéias (Ciência Nova, £ 238), mas sem deixar de perceber haver uma interação entre as esferas da cultura e das idéias e das condições naturais e sociais - o que faria segundo White da “arte, religião, filosofia e até da ciência pouco mais que racionalizações retrospectivas das formas de mediação dos homens com seu meio, nas situações específicas em que se achavam.[13]
Porém essa semelhança com Marx, segundo White é somente superficial, pois a compreensão de Vico era mais sutil, ao pensar que a relação do homem com o mundo dava-se principalmente pela fala – que para ele não era apenas uma consciência do mundo, mas um poder criador e re-formulador do mundo. Parece-me que é neste aspecto que Hayden White privilegia então em suas teorias, debruçando-se sobre as características ditas lingüísticas de cada “era” da teoria de Vico, analisando os diferentes tipos de “fala” de cada período.
Para White, o central no pensamento de Vico, está em um princípio de interpretação (ou hermenêutica), com o qual, entende-se que a própria “fala” fornece indícios e caminhos para “a interpretação de fenômenos culturais” e historicamente passados.[14] É por isso que White reafirma suas teorias, por meio das teorias de Vico: “Aqui a distinção básica se dá entre expressões poéticas, de um lado, e representações em prosa discursiva, de outro. Na sua concepção, a primeira é uma força criativa e ativa graças à qual a consciência apreende o seu mundo; a segunda, uma operação receptiva e passiva na qual se refletem “as coisas como elas são”. Os efeitos desses dois aspectos do discurso sobre a consciência estabelece na própria consciência uma tensão que gera uma tendência do pensamento a transcender-se e a criar, a partir da notória inadequação da linguagem ao seu objeto, as condições para o exercício de sua liberdade essencial.”[15] De tal modo, que por meio destas ponderações encontrará nas reflexões de Vico aplicações para suas próprias – sobretudo com relação as formas de figuras de linguagem – centrais nos estudos de White. De acordo com ele, Vico entendeu que o desenvolvimento de cada civilização pode ser identificado por meio de suas “transformações metafóricas na linguagem”, para ele a dialética de Vico não era silogística (tese, antítese, síntese) “mas antes a dialética do intercambio entre linguagem e a realidade que ela busca abranger.”[16] Assim para White o original em Vico é que usou categorias tropológicas da linguagem figurativa para explicar as transformações das civilizações, em outras palavras, as transformações metafóricas da linguagem em uma era ou civilização poderiam explicar seu desenvolvimento e as transformações da mente humana..[17] De tal modo White escreve sobre a teoria das transformações das eras de Vico:
“1. A transição que vai das principais identificações metafóricas mediante a nominação da realidade exterior em termos tirados das idéias mais particulares e mais sensíveis das partes do corpo e dos estados emocionais, até as reduções metonímicas é análoga à transição, na sociedade, da norma dos Deuses para a norma das aristocracias. 2. A transição das reduções metonímicas para as construções sinedóquicas do todo a partir das partes, dos gêneros a partir das espécies, e assim por diante, é análoga à transição da norma aristocrática para a norma democrática; e 3. A transição das construções sinedóquicas para a afirmação irônica é análoga à transição das democracias regidas pela lei para as sociedades decadentes cujos membros não têm qualquer respeito pela lei.”[18] Ou seja, para White, as figuras de linguagem possuem valor essencial na concepção de tempo e da história que Vico pensou, ligando as formas tropológicas às variadas concepções de sociedade em aspectos variados como os conceitos de natureza humana, os tipos de governo, aos tipos de lei, razão, linguagem, razão ou religião. Seu principal interesse, portanto, é destacar essas variações metafóricas na complexa teoria de Vico.
No final do artigo White elogia Vico: “Assim, aos dualismos e monismos de sua época, Vico opôs uma terceira alternativa, baseada no reconhecimento de que da mesma forma que a morte esta contida na vida e a vida na morte, assim também a selvageria está contida na civilização e a civilização na selvageria; e. o que talvez seja mais importante, baseado no reconhecimento de que o bestial existe no humano da mesma forma que o humano existe no bestial.”[19]

5. Conclusão:

Penso que as idéias de pensadores como Vico, assim como de seus interpretes, devem estar sempre abertas para a discussão, interpretação e exame crítico. Na verdade, acredito que um texto, seja ele de natureza documental ou não – pode ter várias interpretações nenhuma certa ou errada, mas apenas miradas diversas, a partir de lugares diferentes. É por isso, que três intelectuais aqui, podem vislumbrar ou destacar aspectos de um mesmo texto, mas de maneira diversa. Não se pode esquecer, que mesmo que nossas idéias pareçam claras e exatas, elas são sempre suposições – e que o texto possui sempre, em alguma medida autonomia - se esquecermos disto e tomá-los como verdades, perdemos a chance de que por meio da interpretação e reflexão – destes textos e símbolos, vislumbremos o que somos e como poderíamos conhecer do mundo. Temos que ter em vista que somente em diálogo com eles, conscientes de nossas próprias experiências, podemos tentar compreendê-los.[20]

5. Bibliografia.

· Berlin, Isaiah. Limites da Utopia: Capítulos da História das Idéias. São Paulo: Cia das Letras, 1991.
· ____________ A Força das Idéias.(org. Henry Hardy) São Paulo: Cia das Letras, 2005.
· BURKE, P. Vico. São Paulo: Editora da Unesp, 1997.
· CRISTOFOLONI, Paolo. Vico et l´histoire. Paris, PUF, 1995.
· Collingwood, R. G. A Idéia de História. Lisboa: Editorial Presença, s/d
· GARDINER, Patrick. Teorias da História. Lisboa: Fundação Calouste Gulbekian, 1995.
· GADAMER, Hans Georg. Esboço dos Fundamentos de uma hermenêutica. IN: O Problema da Consciência Histórica. (org FRUCHON, PIERRE). RJ: Fundação Getúlio Vargas, 2006
· GUIDO, Humberto.e SAHAD, Luiz F. N. de Andrade e Silva. Tempo e História: no pensamento ocidental. Ijuí: Editora Unijuí, 2006.
· HUNT, Lynn (org.). A Nova História Cultural. SP: Martins Fontes, 2006
· NIETZSCHE, Friedrich. Sobre a verdade e a mentira no sentido extra moral. (org e trad.: Fernando de Morais Barros. SP: Editora Hedra, 2007
· RICOEUR, P. La Mémoire, L´histoire, l´obli. Paris: Éditions de Seuil, 2000.
· WHITE, Hayden. Trópicos do Discurso: Ensaios sobre a crítica da cultura. São Paulo: Edusp, 2001
· ______________ Meta-História: A Imaginação História do Século XIX. SP: Edusp, 1995.
· Vico, Giambattista. Ciência Nova. São Paulo: Ícone Editora, 2008.

[1] O Tempo e a História como Elaboração da Memória: G Vico e a História das Idéias Humanas. IN:GUIDO, Humberto.e SAHAD, Luiz F. N. de Andrade e Silva. Tempo e História: no pensamento ocidental. Ijuí: Editora Unijuí, 2006. p. 43
[2] Iden, p. 45
[3] Por outro lado segundo Collingwood, para Vico, a História pode ser plenamente conhecida pelo homem, já que é um factum somente humano. Para Collingwood, o historiador poderia, segundo Vico, “reconstituir , no seu espírito, o processo que as coisas foram criadas” – o fato do historiador ser também um Homem lhe dá assim a capacidade de captar uma “harmonia” comum – permitindo o entendimento dos documentos e vestígios históricos. Esta idéia é, como destaca Collingwood, profundamente anti-cartesiana, pois contradiz a “estrutura” deste pensamento: cético – que não vê uma relação entre as idéias e as coisas. Para Vico, quando se pensa a forma de conhecimento histórico nem se podia estabelecer tal inferência, pois para ele a História não diz respeito ao passado mas sim à “estrutura do mundo em que vivemos”, para ele não faz sentido perguntar-se se algo ou alguém realmente existiu. Assim, Collingwood deixa-nos esclarecidos que para Vico cada coisa é o que é, e que para o historiador o que importa é o ponto de vista humano – não há como estabelecer diferenças entre idéias e as coisas: ele diz: “A história é uma espécie de conhecimento em que os problemas respeitantes às idéias e os problemas respeitantes aos fatos não são distinguíveis. Ora acontece que precisamente que a filosofia de Descarte distingue esses dois tipos de problemas”. Portanto, para Collingwood, ampliando infinitamente os limites do conhecimento histórico e suas possibilidades, Vico chega à formulação dos ciclos, eras ou períodos históricos – que poderiam apresentar-se de forma a possibilitar a configuração de paralelismos com relação a determinados aspectos da vida humana, entretanto em ciclos diversos e localizados temporalmente distantes entre si. Por exemplo, a Grécia do período homérico tinha traços semelhantes àqueles da idade média. Vico concluiu assim, que esses períodos poderiam ser classificados e se remeteriam periodicamente mas não de forma fixa e fechada. Nas palavras de Collingwood: “Por vezes, Vico apresenta o seu ciclo, do seguinte modo: primeiramente, o princípio orientador da História é a força bruta; depois a força corajosa ou heróica; a seguir, a justiça corajosa; depois a originalidade brilhante; seguidamente a reflexão construtiva; e finalmente uma espécie de opulência esbanjadora e ruinosa, que destrói o que foi anteriormente construído. No entanto, Vico tem plena consciência de que um tal esquema é demasiado rígido para não admitir inúmeras exceções” Está claro, do mesmo modo, que essa teoria não nos permite prever o futuro, como naquelas formulações teóricas que compreendem o tempo histórico de maneira circular.
[4] BERLIN, Isaiah. Limites da Utopia: Capítulos da História das idéias. SP: Cia das Letras, 1991.
[5] Idem, p. 56.
[6] Idem, p. 58
[7] Idem p. 59
[8] Idem, p. 60
[9] Atualmente ele é professor emérito na Universidade da California, Santa Cruz, y professor de literatura comparada na Universidade de Stanford.
[10] Formalista (procuram particularidades e funcionam como uma lente de aumento, organicista (ex: Ranke), mecanicista (ex Marx) e contextualista (ex: Michelet)
[11] WHITE, Hayden. Trópicos do Discurso: Ensaios sobre a crítica da cultura. São Paulo: Edusp, 2001
[12] Para Vico o conhecimento total da natureza era prerrogativa exclusivamente divina. Idem, p. 219
[13] Idem. p. 221
[14] Idem. p. 224-225
[15] Idem. p. 225
[16] Idem, p. 231
[17] Idem, p. 231
[18] Idem, p. 231 e 231
[19] Idem, p. 239
[20] RICOEUR, P. La Mémoire, L´histoire, l´obli. Paris: Éditions de Seuil, 2000.

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